‘Manter os produtores de leite na profissão é uma questão de soberania nacional’
Marcos Tang, presidente da Gadolando, explica que a estiagem no RS aumentou ainda mais o custo de produção e que o produtor 'não suporta mais a baixa na remuneração'
Por Débora Fabrício, de Porto Alegre (RS)
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Soeli Aparecida Lopes Zampieri é produtora de leite na pequena São Jorge, no Rio Grande do Sul. Ela tem 19 animais em lactação na propriedade da família e conta que teve que vender alguns para conseguir baixar os custos com produção de leite.
“Essa é uma das piores crises que estamos enfrentando devido aos altos custos de produção. O quilo do milho chegando aqui a R$ 1,40 e soja em torno de R$ 3,35. A gente está fazendo a ração em casa para tentar diminuir um pouco os custos, mas não estamos calculando a nossa mão de obra. O preço do litro que a gente recebeu no mês passado, dia 15 de fevereiro, foi em torno de R$1,80”, diz.
O sentimento de incerteza atinge também Volnei Schreiner, produtor em Victor Graeff, no noroeste do Rio Grande do Sul. Ele conta que o sentimento é de incerteza porque não sabe quanto vai receber pelo produto.
O presidente da Associação dos Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando), Marcos Tang, afirma que a estiagem aumentou ainda mais os custos de produção e que o produtor não suporta mais a baixa remuneração pelo litro do leite.
“Eu sempre faço essa comparação: enquanto nós tivermos a remuneração pelo leite menor do que temos que pagar por um quilo de ração para nossas vacas, a coisa não está bem e estamos a perigo. Estamos no amor à profissão. Nós precisamos, sim, de uma política talvez de exceção. Manter os nossos produtores de leite vivos é uma questão de soberania nacional”, explicou.
Foto: Embrapa/divulgação
União para mudar
Em Goiás, o produtor e um dos líderes do Movimento Construindo Leite Brasil Tiago Rodrigues explica que o setor precisa de condições mais claras para se desenvolver. “Aí vem a pergunta: vendemos, deixamos esse milho secar no campo para poder vender o grão ou vamos cortar e produzir comida para os animais? Muitos produtores têm secado animais, tem diminuído a produção. Consequentemente, diminuindo essa produção, a gente diminui também o nosso valor, já que ganhamos em cima de litros de leite produzido.”
A Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag), Carlos Joel da Silva, cobra atenção do governo federal para as importações, especialmente as de produtos do Mercosul. “Nós esperávamos que o governo fizesse a sua parte e resolvesse os problemas crônicos no leite, que são as importações. Aumentaram, de novo, muito as importações e o governo, até agora, não barrou. Por outro lado, as indústrias pressionadas pelo comércio, acabam fazendo leilão do leite e acabam jogando o preço do leite ao consumidor mais barato para os supermercadistas”, disse.
Já o presidente do Conselho Paritário de Produtores e Indústrias de Leite do Rio Grande do Sul (Conseleite), Rodrigo Rizzo, diz que os desafios crescem ainda mais por causa do câmbio. “Tivemos um aumento importante na manutenção dos equipamentos de ordenha. Isso se deve ao fato de nós estarmos com uma taxa de câmbio bastante elevada e a tendência é de se manter nesta alta. Enquanto estivermos vivendo essa pandemia e não tivermos a vacina para todos, nós acreditamos que a recuperação da nossa economia como um todo deve ser lenta e gradual”, falou.
Preço vai subir?
Glauco Rodrigues Carvalho, pesquisador da Embrapa Gado de Leite, acredita que os preços devem melhorar à medida que a oferta do produto diminuir.
“Olhando para frente, a gente tem uma perspectiva de entressafra. A gente tem uma perspectiva de recuo na oferta de leite e nós teremos, novamente, o auxílio emergencial. Acredito na recuperação da demanda, o impacto maior talvez venha da oferta, seja pela entressafra nossa ou seja pela redução e recuo no ritmo das importações“, explicou.